Por Maria Angélica Castellani
Nada é eterno, tudo acaba em algum momento, e os projetos também!
Muitas vezes, é difícil concluir o registro das lições aprendidas, pois todas as pessoas que estiveram envolvidas diretamente no projeto estão mais preocupadas com o projeto que virá. Também, na fase final do projeto, o entusiasmo e a motivação caem. As pessoas não querem ser lembradas do que deu errado, e é difícil conseguir a sinergia para a conclusão das lições aprendidas.
Einstein falou alguma vez que “a definição de insanidade é fazer a mesma coisa repetidamente e esperar um resultado diferente cada vez”. Esta expressão pode ser aplicada pela forma como concluímos os projetos. É necessário educar as pessoas sobre a real importância de aprender com as experiências anteriores, da necessidade de capturar esse aprendizado em todas as fases do projeto, paulatinamente à medida que avançamos, e resumi-lo quando terminar.
Cabe ao gerente de projetos e aos patrocinadores mostrar a importância desses conhecimentos. O capital humano das empresas cresce de duas formas: quando a empresa utiliza mais o que as pessoas sabem, e quando um número maior de pessoas sabe mais coisas úteis para a organização. O que os líderes precisam fazer é conter e reter o conhecimento, para que ele se torne propriedade da empresa (Stewart, 1998).
O registro das lições aprendidas deve fazer parte da memória de cada organização. Isso evitará refazer trabalhos e permitirá economia de tempo e de custo.
A seguir, resumo algumas sugestões de como fazer a coleta e o registro das lições aprendidas ao longo do projeto, e como preparar a sua equipe para a finalização com sucesso, utilizando as técnicas do framework Scrum. Na minha experiência, elas foram utilizadas com sucesso e, além dos resultados alcançados, as pessoas envolvidas ficaram mais motivadas com a colaboração, encontraram um momento de aprendizado, de entusiasmo e de distração.
No início do projeto, transmitir para todos da equipe em que consistem as lições aprendidas, seu objetivo e sua importância. Conscientizar as pessoas de que para cada evento do projeto, devem fazer um conjunto de questionamentos e pensarem em diferentes abordagens, que serão discutidas em conjunto. Sugiro realizar estas reuniões periodicamente, de preferência uma ou duas vezes por mês, pois o objetivo é melhorar durante o projeto e não deixar a experiência para futuros projetos.
No framework Scrum, as reuniões de lições aprendidas têm o nome de retrospectivas. Acontecem no final de cada Sprint ou iteração, que é um período fixo de tempo (duas semanas), no qual a equipe se concentra em entregar um incremento do produto. O objetivo de cada retrospectiva é aprender com a experiência e planejar as mudanças para efetivar na próxima Sprint.
A reunião de Retrospectiva cumpre um dos objetivos do Manifesto Ágil que diz:
“Em intervalos regulares, a equipe reflete sobre como se tornar mais eficaz, então refina e ajusta seu comportamento de acordo”.
A dinâmica de uma retrospectiva se compõe dos seguintes passos:
1 – Preparar o cenário: Focar no objetivo da reunião, não exceder o tempo estabelecido, conseguir uma dinâmica produtiva. Definição de regras básicas: Colocar os celulares em vibra call, não interromper o outro, não fazer brincadeiras às custas dos outros.
2 – Procurar dados: Conseguir uma visão comum para ser analisada, composta por fatos, eventos e sentimentos. Técnicas de Timeline. É a base para uma comunicação efetiva durante a reunião.
3 – Entender profundamente os dados: Encontrar as causas profundas de cada tema, problema ou fato com vantagens, entender qual é a causa, ir além da aparência, buscar a causa raiz.
4 – Decidir o que fazer: Uma vez encontradas as causas principais: determinar ações que façam a diferença, designar um “dono” para cada ação, ter certeza de concretizá-las na próxima sprint.
5 – Fechamento: Finalizar claramente a retrospectiva, sempre identificar ações a realizar como resultado de toda retrospectiva.
Deve-se definir um Moderador cuja função deve ser: facilitar a dinâmica e nunca fazer parte da discussão. Ao escrever o que diz um participante, escrever claramente como ele diz. No caso de ser necessária uma forma alternativa: solicitar para o participante, sem sugerir.
Algumas Técnicas de Retrospectivas:
Realizando esta experiência, poderão perceber que embora o tema seja, na maioria das vezes, de difícil aceitação e, portanto, prejudicial na geração de resultados, com o tempo torna-se um jogo. Poderá variar as técnicas, conforme o cenário e as características particulares dos envolvidos.
Para todas as técnicas a seguir, a diretiva principal é:
“Sem importar o que descobrimos, compreendemos e verdadeiramente cremos que todos fizeram o melhor trabalho possível. Dado que sabiam nesse momento, suas capacidades e habilidades, os recursos disponíveis, e a situação particular”.
1 – Técnica clássica.
Gerar uma conversação e buscar respostas às perguntas seguintes:
- O que funcionou bem?
- O que poderia ser melhorado?
Aplicar na hora de coletar dados.
2 – Temas no papel.
Utilizada para grupos de poucas pessoas.
- Criar uma ronda ou sentados ao redor de uma mesa.
- Todos ao mesmo tempo, em 3-5 minutos, cada um escreve três ideias em uma folha.
- Passar a folha para a pessoa da sua direita.
- Ler as ideias expressas e todos escreverem novamente três ideias em 3-5minutos.
- Continuar até que a folha chegue novamente ao seu autor original.
- Aplicar na hora de coletar dados e decidir o que fazer.
3 – Opiniões abertas.
- Preparar duas grandes categorias: “Bom” e “A Melhorar”.
- Cada pessoa vai escrevendo temas em post-its e os coloca na sua categoria.
- Cada vez que um POST-it é colado, explica-se claramente do que se trata.
- O resto escuta, não critica os temas. Resolvem-se dúvidas, se houver.
- Quando não surgir mais ideias, vota-se por algum tema a melhorar.
- Repetir a dinâmica, mas desta vez propondo melhorias concretas nos post-its neutros.
- Realizar uma nova votação.
- Selecionar as 2 ou 3 primeiras melhorias e realizá-las no próximo período até a próxima reunião.
4 – Associação muda.
Cada participante cria idéias (uma por post-it), escreve-as e as coloca em uma das seguintes categorias:
- Desejável: Coisas que funcionaram muito bem, foram boas e se desfrutaram em todo momento.
- Frustrante: ações ou momentos que causaram frustração ou descontentamento.
- Incômodo: essas coisas que resultaram simplesmente incômodas, cada vez que aconteciam.
- Igual: coisas que funcionaram bem e que devemos seguir fazendo.
- Mais: coisas que foram boas e que devemos fazer ainda mais.
- Menos: coisas que deveríamos realizar menos vezes.
– Quando as ideias acabarem, um participante faz uma anotação, faz a leitura e a coloca em outra lousa.
– Se um participante encontra sua ideia parecida ou que aborda o mesmo assunto, deve colocá-la próxima.
– A ideia é ir formando ilhas.
– Ao terminar, a equipe deverá buscar um nome para cada ilha.
– Depois, vota-se por uma ilha para tratar depois.
– A ilha que ganhar é escolhida e o restante é desconsiderado.
– A equipe propõe melhorias concretas em post-its neutros.
– Realizar uma nova votação.
– Selecionar as 2 ou 3 primeiras melhorias e realizá-las na próxima iteração.
Conclusões
É importante que os participantes estejam à vontade para refletir e trocar opiniões abertamente, sem barreiras, apostar em um debate construtivo e convergente para a melhoria contínua, tanto como pessoas como profissionalmente.
Não forçar ninguém a participar, tudo será produto do tempo e da maturidade, nem sempre as pessoas gostam de falar abertamente sobre as suas dificuldades, seus erros e seus acertos.
Pratique e inove, dependendo do tamanho da sua equipe, faça as reuniões durante um café da manhã, ao ar livre, planeje atividades variadas e atrativas, alinhada a valores, cultura e objetivos.
Empresas que integram diversão e trabalho são mais capazes de atrair e reter funcionários de alto desempenho. O trabalho resulta mais produtivo quando é combinado com diversão.
Quem tiver interesse em conhecer mais sobre retrospectivas recomendo o livro Agile Retrospectives: Making Good Teams Great, de Esther Derby e Diana Larsen. Em breve incluiremos em nossa Biblioteca FIXE.
Realize a experiência e compartilhe os resultados conosco!
Poderá ser também do seu interesse:
– Por que ser ágil vale a pena
– Os Valores do Agile Manifesto
– Wikinomics – A Economia da Colaboração
Sobre o Autor:
Maria Angélica Castellani, PMP, CSM, CSD. Formada em Computação Científica pela Universidade Nacional de La Plata, Argentina, com MBA em Gerenciamento de Projetos e MBA em Negócios Internacionais, ambas pela FGV. Especialista em Change Management e em Gestão Estratégica do Conhecimento. Atua há mais de 20 anos em gerenciamento de projetos, melhoria de processos e implantação de PMO. É sócia diretora da empresa FIXE Consulting & Training desde 1999. Palestrante nacional e internacional (Mercosul). Professora de Gestão de Projetos em várias Instituições. Gerente Voluntária do Programa da Revista Eletrônica do PMI-SP (e-news), desde 2008. Co-autora do Livro Gestão de Projetos: Teoria, Prática e Tendências da Editora Elsevier, publicado em outubro de 2014.
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